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10 de set. de 2012

TJSC. Cumprimento de sentença. Art. 475-P, inc. II do CPC. Interpretação

Sobre a matéria, valiosa é a lição de Fredie Didier Jr: O art. 475, P, II do CPC, confirma a regra de que a execução deve ocorrer perante o juízo que processou a causa em primeiro grau de jurisdição. O juízo da execução é o juízo da sentença. Essa regra de competência é bem funcional e segue as características já examinadas: a) é funcional, pois se relaciona ao exercício de função dentro de um mesmo processo - portanto, o desrespeito a esse comando implica incompetência absoluta; b) decorre também de uma conexão por sucessividade. É caso de competência funcional absoluta. No entanto, há um aspecto, pouco abordado pela doutrina, muito importante: ao determinar que a execução da sentença compete ao juízo originário da causa, o legislador também estabelece uma regra de competência territorial. A demanda executiva tramitará no mesmo foro em que tramitou a causa na fase de conhecimento (Curso de direito processual civil: Execução. vol. 5. 3. ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2011. pp. 222).

Íntegra do acórdão

Apelação Cível n. 2010.046202-9, de Joinville.
Relator: Des. Jaime Luiz Vicari.
Data da decisão: 19.04.2012.

EMENTA: FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE DETERMINOU PARTILHA DOS BENS AMEALHADOS PELO CASAL. NOVA SENTENÇA QUE DECLARA EXTINTO O PROCESSO AO ENTENDIMENTO DE QUE COMPETE AO JUÍZO CÍVEL PROCESSAR E JULGAR A DEMANDA ESSA FASE SUBSEQUENTE. MANIFESTO EQUÍVOCO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 475 P DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. COMPETÊNCIA DA VARA DE FAMÍLIA, EM QUE FOI PROCESSADA E DECIDIDA A FASE DE CONHECIMENTO. PRECEDENTE DO STJ. SENTENÇA CASSADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. O juízo que prolatou a sentença é o competente para processar e julgar a subsequente fase de cumprimento. A Lei 11.232/2005 suprimiu o processo de execução de título judicial, instituindo a chamada fase de cumprimento de sentença, a qual, obviamente, tramita na unidade judiciária em que o decisum foi exarado.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2010.046202-9, da comarca de Joinville (3ª Vara da Família), em que é apelante T. M. V. e apelado A. M.:
A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e provê-lo. Custas legais.
Participaram do julgamento, realizado em 12 de abril de 2012, os Exmos. Srs. Des. Ronei Danielli e Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer.
Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Plínio César Moreira.

Florianópolis, 19 de abril de 2012

Jaime Luiz Vicari
PRESIDENTE E RELATOR

RELATÓRIO
T. M. V. ajuizou "ação de dissolução de sociedade de fato" contra A. M., na qual alegou, em síntese, que viveu maritalmente com o réu durante sete anos, e que, nesse período, o casal adquiriu, por meio de esforço comum, diversos imóveis e móveis.
Disse pretender seja decretada a dissolução da sociedade de fato e a partilha dos bens que elencou. Informou, ainda, o processamento da cautelar de arrolamentos de bens que promoveu para preservar o patrimônio arrolado.
O réu contestou (fls. 12-16), houve réplica (fls. 17-19) e audiência de instrução e julgamento com a ouvida de testemunhas (fls. 31-33), bem como foram juntados os depoimentos daquelas ouvidas no processo cautelar (fls. 65-70).
As partes apresentaram alegações finais (fls. 34-39 e 41-47), o representante do Ministério Público manifestou-se (fls. 73-74 e 100-104) e o Juiz da Vara de Família, Infância e Juventude determinou a remessa dos autos à Vara Cível por se tratar de ação de dissolução de sociedade de fato entre concubinos, afeta ao ramo do direito das obrigações (fl. 105) .
Redistribuídos os autos, o Juiz da 3ª Vara Cível declinou da competência em favor da Vara da Família, Órfãos e Sucessões da comarca (fl. 126), para aonde os autos foram remetidos.
Ao manifestar-se (fls. 142-145), o órgão ministerial opinou pela procedência do pedido inicial e, ao sentenciar (fls. 146-153), o Juiz julgou procedente o pedido formulado pela autora, para declarar extinta a sociedade de fato mantida entre as partes e reconhecer o direito da autora à partilha dos bens adquiridos por esforço comum, na constância da sociedade.
Não houve recurso e a decisão transitou em julgado (fls. 163-164).
A autora, então, pediu a execução da sentença (fls. 227-229), e o executado apresentou defesa em forma de contestação (fls. 273-275).
O Juiz, ao sentenciar (fls. 279-280), julgou extinto o processo, com fundamento no artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil, por entender que a prestação jurisdicional encerrou-se com a sentença da ação de conhecimento, de modo que deve a autora, a partir de então, pedir o que entende de direito no juízo cível competente.
A autora apelou (fls. 285-288), pediu o prosseguimento da execução promovida, com base no artigo 475-P, inciso II, do Código de Processo Civil.
O representante ministerial (fls. 298-299) informou não haver interesse na causa que justifique sua intervenção e, sem contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
Este é o relatório.

VOTO
Cuida-se de recurso interposto por T. M. V. contra sentença que julgou extinta a chamada fase de cumprimento, promovida nos autos da ação de dissolução de sociedade de fato que deflagrou contra A. M.
Entendeu o Julgador que não há mais o que discutir com relação à partilha dos bens, pois, a partir da sentença transitada em julgado, as partes passaram a possuir os bens em condomínio, então, a relação havida é de natureza civil e não pode ser mais discutida na esfera do direito de família.
A autora recorreu sustentando que, ao contrário do que entendeu o Juiz, ao indicar acórdão supostamente paradigma, não se cuida aqui de ação de alienação judicial, cujo objeto é a venda de imóvel possuído em condomínio.
Ademais, alegou que a execução da sentença deve prosseguir na 3ª Vara da Família, uma vez que os imóveis objetos da partilha estão em nome de apenas uma das partes.
Lê-se no artigo 575, inciso II, do Código de Processo Civil:
Art. 575. A execução, fundada em título judicial, processar-se-á perante:
(...)
II - o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição.
In casu, a execução é fundada em sentença proferida nos autos da ação de dissolução de sociedade de fato que tramitou na 3ª Vara da Família; logo, resulta evidente a competência do Juízo dessa unidade para o processamento da respectiva fase de cumprimento.
Além disso, o inciso II do artigo 475-P do mesmo código estabelece:
Art. 475-P. O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante:
[...]
II – o juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição;
Sobre a matéria, valiosa é a lição de Fredie Didier Jr:
O art. 475, P, II do CPC, confirma a regra de que a execução deve ocorrer perante o juízo que processou a causa em primeiro grau de jurisdição. O juízo da execução é o juízo da sentença.
Essa regra de competência é bem funcional e segue as características já examinadas: a) é funcional, pois se relaciona ao exercício de função dentro de um mesmo processo - portanto, o desrespeito a esse comando implica incompetência absoluta; b) decorre também de uma conexão por sucessividade. É caso de competência funcional absoluta.
No entanto, há um aspecto, pouco abordado pela doutrina, muito importante: ao determinar que a execução da sentença compete ao juízo originário da causa, o legislador também estabelece uma regra de competência territorial. A demanda executiva tramitará no mesmo foro em que tramitou a causa na fase de conhecimento (Curso de direito processual civil: Execução. vol. 5. 3. ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2011. pp. 222).
Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart destacam que:
Nos casos dos incisos I e II, a regra é bastante simples, fixando-se a competência para a execução no mesmo órgão jurisdicional que atuou na fase de conhecimento. Se este órgão, em que pese a ulterior existência de recurso, é de primeiro grau de jurisdição, aí deverá ser iniciada a execução (Curso de processo civil, volume 3: execução. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: RT, 2008. p. 246).
Considerando que, no caso dos autos, a sentença que determinou a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum não foi efetivamente cumprida, penso ser perfeitamente adequado o seu cumprimento no Juízo da Vara da Família, rem que tramitou a ação de conhecimento.
Em situação semelhante, este Tribunal já decidiu:
PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA. CONDOMÍNIO DE IMÓVEL ENTRE EX-CÔNJUGES. ACORDO PREVENDO A DESOCUPAÇÃO DO BEM PELA MULHER CASO SUA VENDA NÃO OCORRESSE EM 120 DIAS. PETIÇÃO NOTICIANDO O DESCUMPRIMENTO E REQUERENDO A EXPEDIÇÃO DE MANDADO DESALIJATÓRIO NOS PRÓPRIOS AUTOS. INDEFERIMENTO. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO.
A transação homologada pelo juízo em processo de conhecimento é título judicial. Assim, nos termos do artigo 475-P do Código de Processo Civil, é o juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição competente para apreciar o pedido de cumprimento da sentença (Agravo de Instrumento n. 2009.053199-7, de Joinville, rel: Des. Luiz Carlos Freyesleben, j. em 15-9-2010).
O Superior Tribunal de Justiça também já julgou nesse sentido:
É absoluta a competência funcional estabelecida no art. 575, inc. II, do Código de Processo Civil, devendo a execução ser processada no juízo em que decidida a causa no primeiro grau de jurisdição.
Deste modo, representa maltrato à letra do dispositivo legal em referência, a execução de título em foro diverso daquele da tramitação do processo principal, com a característica fundamental de que não se cuida verdadeiramente, quanto ao feito principal, de ação de alimentos, acerca dos quais houve renúncia expressa. A execução é de título judicial originário de ação de separação consensual.
Recurso especial conhecido e provido (Resp nº 538.227, rel. Min. Fernando Gonçalves, j. em 20-4-2011).
Diante desse quadro, deve o presente feito ser processado na 3ª Vara da Família da comarca de Joinville.
Ante o exposto, o recurso é conhecido e provido para cassar a sentença e determinar o retorno dos autos à comarca de origem, para regular processamento, ante o Juízo da 3ª Vara da Família.
Este é o voto.