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28 de jun. de 2012

TJMS. Prova. Instrumento particular.

TJMS. Prova. Instrumento particular. Art. 221 do CC/2002. Distinção entre documento e instrumento. Interpretação. A propósito da distinção entre documento e instrumento, Washington de Barros Monteiro, elucida que: "Documento e instrumento se distinguem por terem identidade própria. Documento não tem a finalidade pré-estipulada de fazer prova ou de criar o ato jurídico, embora possa, eventualmente, servir de prova preciosa de um ato jurídico, mas não é instrumento, pois quem o fez não teve a intenção de criar o ato jurídico ou de lhe fazer prova. Instrumento, entretanto, destina-se a dar vida (criar) o ato jurídico ou a ministrar-lhe prova, servindo de exemplo o pacto antenupcial, a nota promissória ou o contrato" (Curso de Direito Civil, vol. 1, Ed. Saraiva, 29ª ed., p.256). Ainda sobre o instrumento particular leciona Humberto Theodoro Júnior: "O instrumento particular, diante desse quadro geral da prova por documento, pode ser definido como o 'escrito que, emanado da parte, sem intervenção do oficial público, respeitada certa forma, se destina a constituir, extinguir ou modificar um ato jurídico' (em sentido amplo, de modo a compreender tanto o ato jurídico stricto sensu como o negócio jurídico)" (Comentários ao Novo Código Civil, vol. 3, tomo III, Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.468). E, mais adiante, complementa referido doutrinador: "Antigamente, o Código Civil (1916) exigia, além da firma do declarante, que o instrumento particular contasse com a subscrição de duas testemunhas (art. 135). Essa solenidade adicional que tanta celeuma causara acerca da determinação de sua influência, sobre a força probatória do documento privado, foi abolida pelo Novo Código Civil (art. 221). O que importa, no regime atual, é simplesmente a assinatura da parte. A força probante atua contra ela, porque todo conteúdo de escrito assinado presume-se verdadeiramente contra quem o firmou" (Ob. cit., p.472).

Integra do acórdão
Acórdão: Apelação Cível n. 2012.009972-9/0000-00, de Campo Grande.
Relator: Des. Joenildo de Sousa Chaves.
Data da decisão: 16.05.2012.

Primeira Câmara Cível 
Apelação Cível - Execução - N. 2012.009972-9/0000-00 - Campo Grande. 
Relator - Exmo. Sr. Des. Joenildo de Sousa Chaves. 
Apelante - Concremax Indústria de Pré-Moldados de Concreto Ltda. 
Advogado - Hendrick Pinheiro da Silva. 
Apelado - Yacaré- Industria e Comercio de Confecções Ltda. 
Def.Pub.1ª Inst - Helton Campos da Costa. 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – CONTRATO PARTICULAR – ASSINATURA DE SOMENTE UMA TESTEMUNHA – IRRELEVÂNCIA – TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – ART. 221 DO CÓDIGO CIVIL C/C ART. 585, INC. II, DO CPC – INSTRUMENTO CONTRATUAL QUE REVELA O ACORDO DE VONTADES E OBRIGA OS CONTRATANTES AO SEU CUMPRIMENTO – BOA-FÉ OBJETIVA – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. O fato de apenas uma testemunha ter assinado o contrato firmado entre as partes não afasta a qualidade de título executivo para efeito da norma do art. 585, inc. II, do CPC, isso porque basta que o contrato contenha a assinatura de ambas as partes contratantes, circunstância esta que revela o acordo de vontades e explica o surgimento da obrigação, nos termos do art. 221 do CC. 

ACÓRDÃO 
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. 

Campo Grande, 16 de maio de 2012. 

Des. Joenildo de Sousa Chaves – Relator 

RELATÓRIO 
O Sr. Des. Joenildo de Sousa Chaves 
Concremax Indústria de Pré-Moldados de Concreto Ltda., inconformado com a decisão que acolheu os embargos à execução opostos por Yacaré – Indústria e Comércio de Confecções Ltda., para declarar extinta a execução, sem análise do mérito, nos termos dos artigos 267, I; 295, V; 598; 614, I; 616; 795, I do CPC, apela a este Tribunal. 
Afirma que nulidade do título, em razão da assinatura de apenas uma testemunha, não merece prosperar, pois a finalidade do ato realizado entre as partes é o próprio acordo de vontades e o instrumento contratual é somente a forma como esta manifestação foi externada. 
Alega que "pela análise da jurisprudência qualificada pode-se inferir que o art. 585, inciso II, do Código de Processo Civil exige a presença de testemunhas instrumentárias como forma de indicar e verter em linguagem competente o acordo de vontade entre as partes. Portanto, a presença de uma única testemunha é suficiente para indicar e infirmar a obrigação contraída e plasmada no instrumento, considerado pela lei, título executivo extrajudicial." (f.115)
Pugna pelo conhecimento e provimento do recurso. 
A apelada apresentou contrarrazões onde pugna pelo improvimento do recurso e mantença da sentença. 

VOTO 
O Sr. Des. Joenildo de Sousa Chaves (Relator) 
Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Cláudio Moacir dos Santos contra sentença que julgou procedente os embargos à execução opostos pelo Município de Corumbá, a qual reconheceu a falta de interesse de agir do embargado para promover a ação executiva. 
Tenho que assiste razão ao apelante. 
Vejamos o disposto no art. 221 do Código Civil: 

"Art. 221. O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na livre disposição e administração de seus bens, prova as obrigações convencionais de qualquer valor; mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de registrado no registro público". 

Não obstante a análise da higidez do título executivo seja matéria de ordem pública, apreciável, portanto, de ofício pelo juiz, de fato, é irrelevante a ausência de assinatura de duas testemunhas, para efeitos do art. 585, inc. II, do CPC, em especial se há assinatura de uma testemunha, como na hipótese. O instrumento contratual assinado pelas partes revela o acordo de vontades, obrigando o contratante ao cumprimento de seus termos (boa-fé objetiva), e explica o surgimento da obrigação, nos termos do art. 221 do Código Civil. 
Mesmo que ausente a assinatura de uma testemunha no contrato discutido nos autos, como dito, uma testemunha assinou a avença, além, é claro, das próprias partes, que se obrigaram pelo conteúdo do contrato, tal fato não retira a sua qualidade de título executivo para efeito da norma contida no art. 585, inc. II, do CPC, isso porque basta que contenha a assinatura de ambos os contratantes, o que representa o acordo de vontades e a obrigação assumida. 
Tal compreensão se deve ao fato de que o título que faz prova da relação negocial estabelecida inter pars, como na hipótese em testilha, só possui tal autonomia porque é um instrumento contratual e não um mero documento particular. 
A propósito da distinção entre documento e instrumento, Washington de Barros Monteiro, elucida que: 

"Documento e instrumento se distinguem por terem identidade própria. 
Documento não tem a finalidade pré-estipulada de fazer prova ou de criar o ato jurídico, embora possa, eventualmente, servir de prova preciosa de um ato jurídico, mas não é instrumento, pois quem o fez não teve a intenção de criar o ato jurídico ou de lhe fazer prova. 
Instrumento, entretanto, destina-se a dar vida (criar) o ato jurídico ou a ministrar-lhe prova, servindo de exemplo o pacto antenupcial, a nota promissória ou o contrato". (Curso de Direito Civil, vol. 1, Ed. Saraiva, 29ª ed., p.256) 

Ainda sobre o instrumento particular leciona Humberto Theodoro Júnior: 

"O instrumento particular, diante desse quadro geral da prova por documento, pode ser definido como o 'escrito que, emanado da parte, sem intervenção do oficial público, respeitada certa forma, se destina a constituir, extinguir ou modificar um ato jurídico' (em sentido amplo, de modo a compreender tanto o ato jurídico stricto sensu como o negócio jurídico)". (Comentários ao Novo Código Civil, vol. 3, tomo III, Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.468) 

E, mais adiante, complementa referido doutrinador: 

"Antigamente, o Código Civil (1916) exigia, além da firma do declarante, que o instrumento particular contasse com a subscrição de duas testemunhas (art. 135). Essa solenidade adicional que tanta celeuma causara acerca da determinação de sua influência, sobre a força probatória do documento privado, foi abolida pelo Novo Código Civil (art. 221). O que importa, no regime atual, é simplesmente a assinatura da parte. A força probante atua contra ela, porque todo conteúdo de escrito assinado presume-se verdadeiramente contra quem o firmou". (Ob. cit., p.472) 

Sobre o tema vejamos jurisprudência, inclusive de minha relatoria: 

APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – PRELIMINAR – CERCEAMENTO DE DEFESA – INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL E PERICIAL – DESNECESSIDADE – PRELIMINAR AFASTADA – MÉRITO – CONTRATO PARTICULAR – ASSINATURA DE SOMENTE UMA TESTEMUNHA – IRRELEVÂNCIA – TERMO DE RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDA – TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – RECURSO IMPROVIDO. (...) É irrelevante a ausência de assinatura de duas testemunhas, para efeitos do artigo 585, inciso II, do CPC, já que o instrumento contratual assinado pelas partes contratantes revela o acordo de vontades e explica o surgimento da obrigação. (TJMS, Ac 2004.004467-4, 4ª T., Rel. Des. Paschoal Carmello Leandro, j. 05/09/2006) 

APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA CARTA DE FIANÇA EM DECORRÊNCIA DO ANALFABETISMO DO EMBARGANTE/FIADOR – ANALFABETISMO NÃO COMPROVADO – PROVA DE QUE O APELANTE CONHECIA O TEOR DO DOCUMENTO – ASSINATURA DE APENAS UMA TESTEMUNHA NO CONTRATO – IRRELEVÂNCIA – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. (...) O fato de apenas uma testemunha ter assinado o termo de compromisso não afasta a qualidade de título executivo para efeito da norma contida no artigo 585, inciso II, do CPC, isso porque basta que o contrato contenha a assinatura de ambas as partes contratantes, circunstância esta que revela o acordo de vontades e explica o surgimento da obrigação. (...) (TJMS, Ac 2004.000954-2, 1ª T., Rel. Des. Joenildo de Sousa Chaves, j. 01/04/2008) 

Diante do exposto, conheço do presente recurso e dou–lhe provimento para, anulando a sentença recorrida, reconhecer como título executivo extrajudicial o instrumento particular firmado entre as partes, bem como para determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem e seu regular prosseguimento na esteira do devido processo legal. 

DECISÃO 
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte: 
POR UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. 
Presidência do Exmo. Sr. Des. Joenildo de Sousa Chaves. 
Relator, o Exmo. Sr. Des. Joenildo de Sousa Chaves. 
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Joenildo de Sousa Chaves, João Maria Lós e Sérgio Fernandes Martins. 

Campo Grande, 16 de maio de 2012.