O caso começou com uma ação civil pública da Associação Nacional de Defesa da Cidadania e do Consumidor (Anadec), que pretendia ver declarada abusiva a cláusula dos planos de capitalização do Unibanco que estabelece prazo de 12 meses para o resgate do dinheiro investido, a partir da data de desistência. O pedido foi considerado improcedente na primeira instância, ao entendimento de que o contrato não era ilegal.
A Anadec apelou ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que entendeu – tendo em vista o Código de Defesa do Consumidor (CDC) – que havia desvantagem excessiva para o desistente, por causa da redução do valor a ser restituído e também do prazo estabelecido. O Unibanco, então, interpôs recurso especial no STJ.
O relator do caso, ministro João Otávio de Noronha, afirmou que é possível haver pactuação de cláusula que institua prazo de carência para a devolução dos valores aplicados em títulos de capitalização, na hipótese de desistência. Segundo ele, a Circular n. 130/2000 da Superintendência de Seguros Privados (Susep), vigente à época do ajuizamento da ação, estabelece que, nesses casos, "é facultada a fixação de um prazo de carência para a efetivação do pagamento, não superior a 24 meses, contados da data de subscrição do título de capitalização".
O ministro assinalou que a normatização de algumas matérias por meio de resoluções, circulares e outros atos não legislativos tem sido aceita pela jurisprudência, respeitados os limites estabelecidos em lei. Assim, o desrespeito a atos normativos como a circular da Susep seria uma violação da própria legislação que integram.
Por isso, o relator entendeu que o prazo de carência de 12 meses não pode ser declarado abusivo, pois está inserido no tempo previsto pela circular da Susep, e que a cláusula apenas repercute normas legais e regulamentares que "incidem sobre o contrato em que ela foi inserida".
"O formato desenhado para os títulos de capitalização, com suas cláusulas de devolução apenas parcial do capital investido e de prazo de carência para que ocorra essa devolução, além de estar revestido de legalidade, tem raízes também em fundamentos econômicos que justificam o modelo adotado", afirmou João Otávio de Noronha.
Para o ministro, a desistência dos investidores, com devolução imediata dos recursos aplicados, prejudica aqueles que pretendam manter o plano de capitalização estabelecido e compromete a capacidade da sociedade de obter maiores rendimentos nas aplicações de longo prazo e de proporcionar maiores ganhos aos seus clientes.
O relator destacou que deve ser assegurada ao cliente informação clara a respeito dos termos e condições do contrato, a fim de que "não haja surpresa para aquele que o adquire", mas, no caso em julgamento, não havia nenhuma alegação de que o Unibanco tivesse omitido informações aos aplicadores.
"Não tenho dúvidas em afirmar que as operações dessa natureza estão submetidas às regras do Código de Defesa do Consumidor. No entanto, a incidência das normas consumeristas não se deve dar de forma tal que obrigue o fornecedor a desnaturar completamente os seus produtos, principalmente quando elaborados em conformidade com a legislação vigente", disse o ministro.
"Há dezenas de opções de investimento no mercado bancário, cada uma delas com suas peculiaridades, criada, cada qual, para atender a determinado público. Os títulos de capitalização constituem opção de investimento para aquelas pessoas que não têm necessidade da devolução, no curto prazo, dos recursos aplicados", concluiu João Otávio de Noronha.